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20/02/2012

Eros & Psique - Fernando Pessoa


Conta a lenda que dormia
Uma Princesa encantada,quem só despertaria
Um Infante, que viria
De além do muro da estrada.
Ele tinha que, tentado, Vencer o mal e o bem...
Antes que, já libertado, 
Deixasse o caminho errado 
Por o que à Princesa vem.
A Princesa Adormecida, se espera, dormindo espera...
Sonha em morte a sua vida.
E orna-lhe a fronte esquecida, verde, uma grinalda de hera.
Longe o Infante, esforçado, sem saber que intuito tem,
Rompe o caminho fadado, ele dela é ignorado, ela para ele é ninguém. 
Mas cada um cumpre o destino...
Ela dormindo encantada, ele buscando-a sem tino...
Pelo processo divino que faz existir a estrada.
E, se bem que seja obscuro tudo pela estrada fora...
E falso, ele vem seguro,  vencendo estrada e muro,
chega onde em sono ela mora.
E, inda tonto do que houvera, a cabeça, em maresia, ergue a mão, e encontra hera.
E vê que ele mesmo era...
A Princesa que dormia.
 Fernando Pessoa
E assim vêdes, meu Irmão, que as verdades
que vos foram dadas no Grau de Neófito, e

aquelas que vos foram dadas no Grau de Adepto
Menor, são, ainda que opostas, a mesma verdade.

(Do Ritual Do Grau De Mestre Do Átrio
Na Ordem Templária De Portugal)

13/06/2011

Fernando Pessoa - Aniversário

O português Fernando António Nogueira Pessoa, mais conhecido como Fernando Pessoa, completaria 123 anos neste 13 de junho de 2011.
Este vídeo foi produzido em tributo a este grande e consagrado poeta.Ícone da literatura universal!

PRODUÇÃO E NARRAÇÃO: Alba Simões
Aniversário
No TEMPO em que festejavam o dia dos meus anos,
Eu era feliz e ninguém estava morto.
Na casa antiga, até eu fazer anos era uma tradição de há séculos
E a alegria de todos, e a minha, estava certa com uma religião qualquer.

No TEMPO em que festejavam o dia dos meus anos,
Eu tinha a grande saúde de não perceber coisa nenhuma,
De ser inteligente para entre a família,
E de não ter as esperanças que os outros tinham por mim.
Quando vim a ter esperanças, já não sabia ter esperanças.
Quando vim a olhar para a vida, perdera o sentido da vida.

Sim, o que fui de suposto a mim-mesmo,
O que fui de coração e parentesco.
O que fui de serões de meia-província,
O que fui de amarem-me e eu ser menino,
O que fui — ai, meu Deus!, o que só hoje sei que fui...
A que distância!...
(Nem o acho...)
O tempo em que festejavam o dia dos meus anos!

O que eu sou hoje é como a umidade no corredor do fim da casa,
Pondo grelado nas paredes...
O que eu sou hoje (e a casa dos que me amaram treme através das minhas
lágrimas),
O que eu sou hoje é terem vendido a casa,
É terem morrido todos,
É estar eu sobrevivente a mim-mesmo como um fósforo frio...

No tempo em que festejavam o dia dos meus anos...
Que meu amor, como uma pessoa, esse tempo!
Desejo físico da alma de se encontrar ali outra vez,
Por uma viagem metafísica e carnal,
Com uma dualidade de eu para mim...
Comer o passado como pão de fome, sem tempo de manteiga nos dentes!

Vejo tudo outra vez com uma nitidez que me cega para o que há aqui...
A mesa posta com mais lugares, com melhores desenhos na loiça, com mais       copos,
O aparador com muitas coisas — doces, frutas o resto na sombra debaixo do alçado —,
As tias velhas, os primos diferentes, e tudo era por minha causa,
No tempo em que festejavam o dia dos meus anos...

Pára, meu coração!
Não penses! Deixa o pensar na cabeça!
Ó meu Deus, meu Deus, meu Deus!
Hoje já não faço anos.
Duro.
Somam-se-me dias.
Serei velho quando o for.
Mais nada.
Raiva de não ter trazido o passado roubado na algibeira!...

O tempo em que festejavam o dia dos meus anos!...
Fernando Pessoa
(Álvaro de Campos) 

18/01/2011

Vaga, no Azul Amplo Solta

Vaga, no azul amplo solta, 
Vai uma nuvem errando. 
O meu passado não volta. 
Não é o que estou chorando. 

O que choro é diferente. 
Entra mais na alma da alma. 
Mas como, no céu sem gente, 
A nuvem flutua calma. 

E isto lembra uma tristeza 
E a lembrança é que entristece, 
Dou à saudade a riqueza 
De emoção que a hora tece. 

Mas, em verdade, o que chora 
Na minha amarga ansiedade 
Mais alto que a nuvem mora, 
Está para além da saudade. 

Não sei o que é nem consinto 
À alma que o saiba bem. 
Visto da dor com que minto 
Dor que a minha alma tem. 

Fernando Pessoa, in "Cancioneiro"

01/06/2010

Poesia de Álvaro de Campos

FERNANDO PESSOA
Cartas de Amor
Todas as cartas de amor são
Ridículas.
Não seriam cartas de amor se não fossem
Ridículas.
Também escrevi em meu tempo cartas de amor,
Como as outras,
Ridículas.
As cartas de amor, se há amor,
Têm de ser
Ridículas.
Mas, afinal,
Só as criaturas que nunca escreveram
Cartas de amor
É que são
Ridículas.
Quem me dera no tempo em que escrevia
Sem dar por isso
Cartas de amor
Ridículas.
A verdade é que hoje
As minhas memórias
Dessas cartas de amor
É que são
Ridículas.
(Todas as palavras esdrúxulas,
Como os sentimentos esdrúxulos,
São naturalmente
Ridículas.)Álvaro de Campos, 21-10-1935